Álcool e Drogas

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O vício visto de dentro das células

Os mecanismos que levam ao vício puderam ser mais bem entendidos nos últimos dez anos com os avanços da neurociência. Adaptação celular, tolerância, explicações para a abstinência: o ciclo vicioso pode estar dentro de nossas células e ter um componente hereditário. Mas fatores psicológicos não são descartados.

A origem do bem-estar

Quem usa a droga se sente bem. Tanto o álcool quanto a maconha vão bombardear o sistema dopaminérgico. Quando bombardeiam o sistema dopaminérgico, liberamos dopamina e ficamos alegrinhos. O álcool tem os dois efeitos: você fica tranqüilo, que é o efeito ansiolítico, e ao mesmo tempo tem um efeito euforizante.

Avanços da ciência

Hoje nós sabemos os efeitos no nível molecular. Hoje nós sabemos muito mais desses efeitos das drogas. Estamos descobrindo os circuitos da adição (dependência) com o advento da neuroimagem, da neurociência e da biologia celular, que trouxeram a possibilidade de se verificar a ação das drogas no sistema nervoso central. Há uns dez anos isso não era possível. Por que os circuitos da adição? Uma vez que se sabe onde as drogas atuam, sabemos onde poderão dar futuramente problemas. Antes isso não era possível de se estudar e nem de ser observado. Hoje, com uma análise de biologia molecular, estudamos esses fenômenos em nível celular, de como as drogas chegam às células e como ativam os receptores. Também verificamos o efeito visualizando o cérebro, como ele reage a essas drogas. De dez anos para cá houve uma verdadeira revolução.

Adaptação celular

Por exemplo, por que um indivíduo desenvolve o vício? Qual é o mecanismo da adição? Vamos pegar como exemplo o caso do álcool, mas isso é aplicado de uma certa forma para todas as drogas. O indivíduo usa o álcool para se sentir tranqüilo. Chega em casa toma um vinhozinho, um uísque. Isso vai aumentar os efeitos das células de inibição do sistema nervoso central. Aumenta o poder ansiolítico. Acontece que bombardeando o sistema nervoso central com álcool, a célula começa a desenvolver uma adaptação, ela começa a reduzir os efeitos de inibição do sistema gabaérgico. É o que chamamos de adaptação homóloga. Adaptação homóloga porque vai ser específica para o álcool e quando o álcool bater na célula ele não vai ter o mesmo efeito ansiolítico. Qual é a repercussão disso? O indivíduo precisa beber mais para manter o mesmo efeito. A célula cria uma defesa contra o álcool. Quando bombardeada, aquilo acelera a inibição, que potencializa o efeito ansiolítico, mas a célula começa a se defender. De tal sorte que será preciso, com o tempo, de mais álcool para ter o mesmo efeito que se tinha lá atrás.

Esgotamento celular

A célula se defende porque identifica um fator externo solicitando uma inibição acima do que ela pode cumprir. É como se ela entrasse em esgotamento. São dois os mecanismos de adaptação desenvolvidos. O outro tipo de adaptação é em nível celular, intracelular, com canais de cálcio. Aí entra toda a parte de fisiologia. Mas no nível intracelular, a adaptação não vai ser só para um tipo de droga, vai ser para qualquer droga que causar um efeito naquele sistema de neurotransmissão. Então a adaptação homóloga cria uma parede, uma espécie de barreira celular, impedindo que a droga estimule o funcionamento celular. E na adaptação heteróloga, você vai ter mecanismos dentro das células, de proteção. Independente da droga que estimula a célula, ela vai ativar a defesa que construiu. Vamos supor, o cara que bebe álcool e que usa cocaína, vai ter uma adaptação que vai precisar de mais álcool e de mais cocaína para ativar o sistema intracelular.

Componentes biológicos

O que nós achamos hoje? O fenômeno do vício tem uma parte que é biológica. Achar que maconha é só psicológico é uma baita balela. Por quê? Ninguém vai usar uma droga só por seu efeito de sugestionabilidade. A pessoa usa uma droga porque ela causa de fato um efeito. Se ela causa de fato um efeito, tem uma parte que é celular, só pode ser celular. Tanto a nicotina, quanto o álcool, quanto a maconha ativam as células do sistema nervoso central. Ao ativar essas células, do ponto de vista biológico, hoje, nós sabemos que as células vão desenvolver uma adaptação. A adaptação da célula é para reduzir o efeito externo que essas drogas promovem. Isso é o que nós chamamos de um fenômeno de tolerância.

Tolerância

Se uma pessoa virgem usar meio grama de cocaína, ela pode ter uma parada respiratória, o organismo não está preparado para aquela quantidade de droga. Quando uma pessoa começa a usar droga, uma carreira de coca é suficiente para dar uma baita euforia, para a pessoa se sentir bem. Mas aí o que acontece? Ela vai lá e usa outra carreira. No começo os intervalos são maiores, entre o uso da carreira e o bem-estar que a pessoa tem em decorrência do uso. Quando vai jogando cocaína, a célula vai, com o tempo, ao longo dos anos, desenvolvendo uma adaptação. Fala: “opa, não jogue tanta cocaína porque eu não tenho como fazer tanta dopamina”. Então tem-se uma barreira que é extracelular, que é aquela adaptação homóloga, e tem-se uma barreira intracelular, que é heteróloga. Que na verdade o heterólogo é o que hoje nós consideramos o problema da adição cruzada. Quer dizer, quando o indivíduo tem problema de vício e de adição a drogas é porque ele desenvolveu não só um problema com a cocaína, mas com todas as drogas que vão bombardear o sistema dopaminérgico. Em resumo, é o seguinte, com o tempo, como as células desenvolvem esses mecanismos de proteção, no nível intracelular e no nível extracelular, a pessoa precisa de mais drogas para ter o mesmo efeito. Com o tempo, vai ser preciso aumentar a quantidade de drogas para ter o mesmo efeito que se tinha no começo. Isso que é o vício: a adaptação celular à quantidade de drogas que você precisa para promover aquele bem-estar que você tinha com um pouquinho de drogas.

Herança genética do vício

Cada indivíduo tem a sua biologia particular. Toda essa parte biológica é gerenciada pelo que nós herdamos, pelos genes, que vão orquestrar todo o funcionamento do sistema de RNA e de funcionamento da célula. Então as pessoas têm vulnerabilidades diferentes para desenvolver esses mecanismos de adaptação. Algumas pessoas podem até não desenvolver os mecanismos de adição. Mas nós sabemos que tem um grupo mais vulnerável que desenvolve essa resposta celular, em geral 10% da população. O que quer dizer isso? Esses 10% vão ter o mecanismo ativado com o tempo e serão aqueles que irão precisar de muita droga para ter o mesmo efeito que tinham no início. Então começa-se a ingerir quantidades tóxicas, seja de álcool ou de cocaína. Esse é o vício. A célula desenvolveu a tolerância. O que é a tolerância? O indivíduo como tempo passa a tolerar grandes quantidades seja de álcool seja de cocaína. Por isso que ele precisa de uma quantidade maior para sentir o mesmo efeito. De sorte que, no começo, se o indivíduo usar meio grama de cocaína, ele pode morrer. Uma pessoa que desenvolve os mecanismos de tolerância, pode usar 15, pode usar, 3, 5, 15 gramas em 24 horas e o cara está lá, não morre. Por quê? Porque ele desenvolveu tolerância e ele precisa aumentar. Qual a chave do problema?

Uma vez viciado, sempre viciado

Uma vez desenvolvido o mecanismo de defesa celular, nós não sabemos como desativá-lo. Por isso que uma pessoa que desenvolve o vício permanece com o vício. A comparação que eu faço é com a transamazônica. Uma vez que se abriu aquele caminho, aquele caminho está aberto. Quando entrar cocaína, vai passar por ali. Porque a estrada, bem ou mal, está aberta. O indivíduo que desenvolve a adição nunca mais vai usar a droga como usava antes. Aquilo fica guardado no célula, fica na memória celular.

Biologia X psicologia

Mas o vício é um fenômeno biológico? Não, o vício é um fenômeno também biológico. As pessoas não gostam de compreender, tem um certo preconceito de achar que o biológico não entra. Mas hoje isso está desvendado. É que poucos estudam. Mas quem estuda esses fenômenos e está acompanhando os avanços da neurociência sabe que isso está muito bem estabelecido. É algo que já foi muito bem desenvolvido. Então, a adição tem um componente biológico importante, mas é óbvio que o que acontece no desenvolvimento do vício não é só a questão da neurodaptação. No desenvolvimento do vício, seja de álcool ou de cocaína, temos aspectos psicológicos (do indivíduo mais ansioso, mais deprimido ou tímido, por exemplo). Enfim, as drogas ajudam as pessoas a quebrar barreiras de defesa, de timidez e assim por diante. Temos os aspectos psicológicos e também os de grupo. Usar cocaína, álcool e mesmo maconha tem a ver com uma relação tribal, de rituais dos jovens. Na verdade, o vício é uma combinação de fatores. Ele se desenvolve através de fatores biológicos, psicológicos e culturais. A dependência é uma combinação de fatores biológicos, psicológicos e culturais. Todos eles vão atuar de forma simultânea e aí o indivíduo vai desenvolver a dependência.

Livro Finalista do 56o Prêmio Jabuti

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